domingo, 19 de agosto de 2007

SMASHING PUMPKINS

Matéria de Bruno Lesprit para o LeMonde, tradução de Jean-Yves de Neufville para o UOL Mídia Global.

O indie-rock cede ao apelo do dinheiro

Os organizadores do festival La Route du Rock (A Rota do Rock), de Saint-Malo, na Bretanha, devem se sentir aliviados: durante a noite da quinta-feira, 16 de agosto, o gramado da fortaleza de Saint-Père estava totalmente tomado pela multidão que ali estava para assistir ao retorno do grupo americano Smashing Pumpkins. No palco, as "abóboras amassadas" recorrem amplamente ao repertório do disco "Mellon Collie & The Infinite Sadness" (1995), um dos álbuns duplos mais vendidos da história do rock.

Eles haviam se despedido "em definitivo" em 2000, mas nem Zwan, a efêmera nova formação criada por Billy Corgan, nem o seu álbum solo lhe permitiram retornar ao topo do sucesso. Daí a recriação (só restaram do grupo original Corgan e o baterista Jimmy Chamberlin) para a gravação de um álbum, "Zeitgeist", que foi lançado no início de julho, mas que nunca garantirá os lucros proporcionados por "Mellon Collie", por duas razões: a ausência de inspiração que predomina em todo o disco e, sobretudo, a crise do disco.

Prêmio à autenticidade

Para bancar o show dos Pumpkins, o festival Route du Rock, que termina em 17 de agosto, quebrou o seu porquinho: 120.000 euros (R$ 330.000). Ou seja, 45% do orçamento total da programação deste ano, que comporta trinta atrações. É o maior cachê da história deste festival, que ainda assim havia apresentado The Cure, em 2005. "Mas os Smashing Pumpkins", argumenta o seu diretor, François Floret, "podem aumentar o seu preço até US$ 1 milhão".

Pode parecer surpreendente que este evento musical que, desde 1991, vem privilegiando os artistas emergentes, sucumba a tamanha loucura. Durante muito tempo, o mundo do rock esteve dividido em dois campos antagônicos: a "mainstream", a corrente dominante, supostamente conformista e consensual com as suas estrelas consagradas, e o "indie" (de independente, em inglês), uma corrente alternativa voltada para a novidade e norteada por uma filosofia que se reclama da herança do punk. Só que esta distinção perdeu muito da sua pertinência. O "independente" hoje beneficia de uma mais-valia de autenticidade que poderia muito bem aproximá-lo do seu fim. Não é por acaso se a gravadora Universal acaba de comprar dois selos que correspondem a este rótulo, o britânico V2 (Bloc Party, Stereophonics) e o francês Atmosphériques (Louise Attaque, Abd Al-Malik).

Certos grupos, como Placebo e Muse, que foram ouvidos no passado no Route du Rock, estão cobrando hoje quantias fabulosas. "Eles passaram para o lado negro da força", ironiza François Floret; "300.000 euros [R$ 824.000], a gente não consegue pagar isso". Então, eles se voltam para os seus maiores concorrentes, os quais despontam como "festivais oportunistas", suspira François Floret, "que não estão nem aí com a ética 'independente'".

No editorial da programação da 17ª edição do Route du Rock, o seu organizador escreve: "A moda está para o rebelde e a música (...); o que nós chamávamos orgulhosamente durante os anos 1980 de música "independente", na época sinônimo de um real engajamento visceral, transformou-se hoje num sinal por meio do qual se reconhece alguém "descolado". Então, a estética original do Route du Rock acabou ficando um pouco banalizada, diluída (...). Hoje, a ousadia é cada vez menos uma qualidade que diz respeito aos audaciosos que tocam com as suas tripas, pois ela tornou-se na maior parte dos casos uma antecipação calculada que corresponde à lei da oferta".

A palavra "independente" designa artistas que não gravam para as "majors" da indústria fonográfica(Universal, Sony-BMG, EMI, Warner), e sim para selos que são, eles também, "independentes". Por extensão, seriam estes selos que recusariam a formatação musical. "Isso hoje não quer dizer mais nada", constata François Floret. "Radiohead ou Björk (inacessíveis para orçamentos moderados) continuam sendo considerados como independentes". Os Smashing Pumpkins também, apresentados no programa do Route du Rock como "o grupo que rapidamente reinou todo-poderoso sobre o mundo do indie-rock", enquanto eles gravam agora para a Warner.

A queda do faturamento no setor fonográfico, que levaria os saltimbancos a se recuperarem financeiramente com a bilheteria dos concertos, não explica tudo. Os agentes de músicos, não necessariamente confirmados, mas s que beneficiam de um sucesso possivelmente passageiro, promovem uma espécie de leilão entre festivais, com chantagem se algum deles quiser reservar para si a exclusividade sobre determinada atração.

Neste ano, o Route du Rock foi forçado a aumentar a seu orçamento em 100.000 euros em relação à edição precedente. "Ontem, o cachê mínimo de um artista principiante era de 2.500 euros. Hoje, ele é de 4.000 euros", afirma François Floret. "Além disso, um artista não cobra o mesmo de uma sala ou de um festival. Para nós, é sempre 30% mais caro. Nós somos um pouco otários".

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